segunda-feira, 20 de abril de 2009

Os três namorados da velha

Essa é mais uma dos transportes. Dessa vez porém, o que aconteceu comigo foi na van – o famoso transporte alternativo – neste último domingo. A personagem principal também não era nem homem e nem estava bêbada – era uma senhora, muito sóbria por sinal. A semelhança? Ela também se sentou ao meu lado e deu-se a falar.

Logo que entrou na van, chamou atenção de todos, falando alto, mas sem urrar, solicitando ajuda ao trocador para que a ajudasse com as sacolas de compras, pois já se tratava de uma velha, que ainda dava pro gasto – ela disse – e que tinha inclusive três namorados: um para o amor, outro para o sustento e mais um poeta, artista.

O amante profissional era, segundo ela, um estudante de educação física; forte e prestativo no que a interessava, sendo contudo um asno, que ela não se atrevia a levar a nenhum ambiente social – não por possível preconceito referente à diferença entre a idade de ambos – mas pelo risco de encontrá-lo se atrevendo a falar algo nas rodinhas de bate-papos que surgem em todas as festas. Era um verdadeiro fraco homem forte.

O outro namorado era o provedor – aquele típico homem da casa, que paga as contas – apesar dela fazer questão de destacar que ele dividia com ela – mas enfim, era o que a fazia bem, não por levá-la a uma alegria física ou por lhe contar piadas, mas pela tranquilidade e segurança que a passava, sendo aquele que sempre “chegava junto”, não lhe deixando faltar “nada”.

O terceiro e último namorado era o que podemos chamar de artista. Ela o chamava de poeta, compositor. Para ela, ele a via como sua musa inspiradora. E ainda que não existisse amor de contato, existia amor de alma. Seu nome estava sempre em suas melodias; seu rosto sempre em suas telas; sua essência sempre estampada nos acrósticos poéticos. Apesar de não ajudar a pagar a conta de nada, nem de lhe satisfazer algumas de suas necessidades físicas, ele a preenchia com doces palavras que a faziam se sentir amada.

Cheguei ao meu ponto e desci antes dela ter me dito o nome dos supostos três namorados. Ao que tudo indica, era uma ilusão bem humorada acerca da vida que ela possuía. Mas, o que nos chama atenção é justamente a dificuldade que muitas pessoas encontram de se sentirem amadas e de decidirem amar.

A grande maioria deseja muito as belas embalagens, ainda que o presente seja made in china – se a embalagem for bonita, se o embrulho tiver sido bem feito, se a capa for dura e ficar bonito na estante, compramos, queremos, aceitamos e desejamos o presente.

Outra grande maioria confunde enormemente a noção de segurança e respeito com a famosa frase “mas eu nunca te deixei faltar nada”, associando sempre este NADA, justamente ao dinheiro, como se esse fosse o TUDO. É como se eu oferecesse à minha esposa e filhos o TUDO que eu achasse de mais importante, para que eles pudessem reconhecer o esforço que eu possa ter diariamente, trabalhando para “lhes dar uma vida digna” (essa é outra frase campeã de audiência!). Todavia, o que eles queriam e precisavam de verdade, era menos 50 % dessa mesada de TUDO o que NADA representa e mais 25 % do NADA que eu tenho lhes dado: presença real, atenção e presteza.

Ah, fala a verdade: quem não gosta de ser paparicado, de ser agraciado com doces palavras que venham de encontro à necessidade universal do homem de se sentir amado? Assim que, na figura do último namorado desta figuraça que a vida me fez encontrar na van – logo eu, de novo! – temos a representação clara do amor utópico e platônico, que nos faz romper barreiras e vencer obstáculos. Do amor cantado por muitos, desenhado por outros, escrito por tantos. São possíveis amores impossíveis, que nos deixam tão embasbacados!

No meio de toda esta alegria exterior, que marcou meus 30 minutos de viagem naquela van, existia latente dentro daquela senhora, um desejo que existe em tantas outras milhões de pessoas, velhas ou novas – o desejo de se ter alguém para amar e ser amado. E mais ainda, o questionamento que muitos têm é porque o meu amante, que sempre foi meu poeta, hoje, no máximo e com muito esforço, apenas me ajuda no sustento?

A “velha” se foi, mas a lição que nos fica e que serve de moral para essa pequena história é só uma: se você tem ao seu lado alguém que continua te ajudando no sustento, mas que ainda te ama de verdade e se inspira com seus olhos, com suas palavras e com seus gestos, bem aventurado és tu!

Só vitória, nesse Cristo que verdadeiramente nos ama, sustenta e inspira!

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