quarta-feira, 6 de maio de 2009

De que vale servir a Deus?

Ao olharmos para a vida de Salomão, pelo que a Bíblia nos oferece, vemos além de um homem especial e o mais sábio de todos, três fases distintas, traduzidas pelas três obras que a tradição rabínica judaica atribuirá a ele. Na cronologia, o tão mal compreendido e sensual “Cantares” teria sido escrito pelo jovem rei; “Provérbios” viria um pouco mais tarde, tendo sido elaborado no auge de seu reinado e o assombroso “Eclesiastes” já no fim de sua vida.

Como não pretendemos analisar, aqui e agora, a historicidade da autoria desses livros, muito menos a teologia neles expostas, me conterei apenas em alguns dos versículos mais decepcionantes, tristes e pra baixo de toda a Bíblia – todos eles, tirados de Eclesiastes.

O primeiro balde de água fria vem logo no terceiro versículo. Questionará assim o sábio pregador: “Que proveito tem o homem de todo o seu trabalho, com que se afadiga debaixo do sol”? É claro que seria um verdadeiro crime exegético citar esse versículo isoladamente e fora do contexto. Assim, indicamos sempre que a leitura da perícope inteira seja feita quando não a citarmos aqui. Na conclusão deste trecho ele dirá: “Geração vai, e geração vem; mas a terra permanece para sempre”. Ou seja – trabalhamos, nos cansamos, nos “matamos”, e nada disso levamos daqui.

Para fundamentar minha teoria decepcionante, não poderia de citar apenas este verso isolado. Então, lá vai uma listagem resumida de algumas palavras verdadeiramente animadoras do sábio mais famoso de Israel:

“...todas as coisas são canseira...” (1,8)

“Aquilo que é torto não se pode endireitar...” (1,15)

“Porque na muita sabedoria há muito enfado...” (1,18)

“Resolvi no meu coração dar-me ao vinho regendo-me, contudo, pela sabedoria, e entregar-me a loucura até ver o que melhor seria que fizessem os filhos dos homens debaixo do céu, durante os poucos dias de sua vida” (2,3)

“Como acontece ao imbecil, assim acontece a mim, porque pois busquei eu mais sabedoria?” (2,15)

“Há tempo de morrer... de matar... de derrubar... de chorar... de perder... de aborrecer... de guerra...” (3,1-8 – destaquei apenas as partes decepcionantes)

“o que sucede aos filhos dos homens sucede aos animais; como morre um, assim morre o outro... todos vão para o mesmo lugar; todos procedem do pó e ao pó tornarão” (3,19 e 20)

“pelo que tenho por mais felizes os que já morreram, mais do que os que ainda vivem” (4,2)

“melhor é o dia da morte do que o de nascimento; a casa onde há luto do que onde há banquete; a mágoa do que o riso; porque com a tristeza do rosto se faz melhor o coração" (7,1-3)

“a pequena comemoração se faz para rir, o vinho alegra a vida, e o dinheiro atende a tudo” (10,19)

A listagem acima não é exaustiva e sim seletiva, interpretativa e totalmente tendenciosa. Foi escolhida com o intuito real de destacar apenas as decepções e tristezas de um sábio, que ao olhar refletivamente para sua vida, percebe que algumas coisas nunca mudam; que outras não valem tanto a pena quanto se achou que valia; que alguns esforços são desnecessários; que alguns stress descabidos; que alguns prazeres não são tão pecaminosos quanto se imaginava; que algumas verdades, não passam de mitos e que algumas ilusões às vezes se realizam.

O motivo dessas citações, já confessado por mim, propositalmente e preguiçosamente colocadas em sua maioria destacadas do contexto real do livro do Eclesiastes, tem a intenção de apenas lembrar desse livro tão esquecido e pouquíssimas vezes lido com atenção necessária.

Temos aqui uma riqueza incomparável do relato de um sábio, que ao analisar a sua vida inteira, faz um testamento de despertamento para aqueles que viriam após ele. Temos aqui a imagem do pai que não quer que seus filhos cometam os mesmos erros; o pastor que insiste para que suas ovelhas não venham cair no mesmo buraco; o Deus que nos orienta sobre os percalços dessa vida debaixo do sol.

Mas a decepção não é descabida ou ainda total. Salomão como bom analista da vida como arte, tem uma conclusão para tudo isso. O destaque que ele faz questão de relatar é para que não venham a dizer que ele não avisou nada – ele avisou sim e muito e há muito tempo. O mal existe e com ele os dias maus também. As decepções acontecem, as perdas, as dores de cabeça e cansaço. O enfado e a fadiga de um dia estão sobre justos e injustos. Os tolos se darão bem de vez em quando, enquanto sábios aparentemente serão deixados para trás. O mundo parecerá, ainda que por instantes, ser dos espertos e não dos esforçados. A vida, às vezes, parecerá não ter sentido, gosto ou prazer. Mas entenda: existe espaço para tudo isso. Temos que entender que em nossa vida, cabe tanto a tristeza quanto a alegria; a vida quanto a morte; o prazer e o desânimo. Há sim, tempo para todas as coisas e propósitos debaixo do céu.

Contudo, a lembrança final do sábio e as palavras com que ele queria ficar sendo lembrado nos orientam a lembrar do nosso criador em quanto temos tempo (cap. 12). E finaliza com esplendor de alma: “De tudo o que se tem ouvido, a suma é: Teme a Deus, e guarda os seus mandamentos; porque isto é o dever de todo o homem. Porque Deus há de trazer a juízo todas as obras, até as que estão escondidas, quer sejam boas, quer sejam más”. Ou seja – entenda, de uma vez por todas, que ainda que não pareça (e convenhamos, as vezes realmente não parece) vale MUITO a pena, servir e temer ao SENHOR!

Só vitória no Cristo que nos tem feito fazer valer a pena cada dia!

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